terça-feira, 21 de fevereiro de 2012

Uma flor e uma carta de amor.

Quando somos pequeninos damos valor a coisas que ninguém liga: aquele peluche velho e feio que dorme conosco todas as noites sem sair do nosso lado; aquela avó que nos dá doces e nos estraga os dentes, que nos deixa ver todos os desenhos animados que queremos em vez de fazermos os trabalhos da escola; aquele avô que nos ensina a andar de bicicleta e que nos levanta quando caimos em cima de pedras e que mesmo que haja sangue em todo e qualquer pedaço de tecido das nossas calças nos diz "isso não é nada!"; ao lanche feito de pão com manteiga e uma caneca de leite; às canetas coloridas que usamos para ointar em sitios menos próprios como nas mesas ou nas paredes; gostamos de imitar as vozes dos animais ou dos comboios e usamos uma vassora para fazer de cavalo e passear por um mundo encantado que só nós vemos... Quando somos pequenos vemos tudo com outros olhos, guardamos imagens tão diferentes das que guardamos agora, cheiros, emoções. É tudo tão mais fácil, inclusivé o amor. Quando eu era pequenina o amor resumia-se a um beijo na bochecha e a um pão com manteiga ou oas bolicaos que eu comprava e não comia (nem sequer gostava deles) para dar ao meu namorado, fui crescendo e passei do rosa ao preto, o amor morreu, deixou de existir. A primeira paixão foi sofrida, o primeiro amor penoso. Quis porque quis deixar de sentir, e consegui. Até que ele apareceu, com o seu génio diferente, calado, timido, e com tanta força. Não era amor, nem era paixão, pelo menos não era nem só um, nem só o outro, eram os dois. São. São simples, no melhor dos sentidos, sem deixarem de ser avassaladores. Arrancam-me suspiros e levam-me os sentimentos ao extremo. É assustador e faz com que faça coisas assustadoras, poderia dar uns quantos exemplos para que o mundo percebesse o tipo de insanidades e disparates que este sentimento tão complexo, e no entanto tão simples, me faz fazer e dizer, mas isso seria expor a intimidade que me é tão preciosa. Além disso não acho que quem me lê precise realmente dos pormenores, concerteza têm os seus próprios pormenores. É o melhor do mundo, este sentimento. Faz-me ver as coisas com outros olhos, com os olhos cor-de-rosa de quem dá importância às pequenas coisas da vida, que acabam por ser gigantescas e ganhar toda a importância e marcam a diferença neste mundo tão cinzento onde vivi durante tanto tempo. Uma palavra, um sorriso, um gesto, uma mania, um pormenor que só ele conhece, uma lágrima no canto do olho limpa com a parte de trás da mão, pão com manteiga arranjado com tanto carinho, um café e uma amêndoa amarga, uma flor e uma carta de amor...
Bastas-me, P.

sábado, 4 de fevereiro de 2012

Assobia

A carga emotiva que aquele tom de voz transportava fazia com que os seus olhos se enchessem de lágrimas. Emocionava-se com aquele som que parecia invádi-la até aos confins do seu próprio corpo, da sua própria alma, como se não houvesse mais nada à sua volta, como se nada mais tivesse importância. Naquele momento, a sua atenção era só e apenas para o som daquela voz tão imponente, mas tão familiar. O som do passado, o tom de voz das recordações mais queridas, mesmo que nunca se tivesse dado conta de que o fossem... Outra vez o som, um assobio! Aquele som, aquela melodia tão conhecida. Levanta-se a correr e abre a porta, lá vai ela escada acima, seguindo o som. Quando entra na sala vê o rosto da voz, tão mais novo do que ela se lembrava, quase que se esquece que ele não está cá, que já não vive aqui. Sorri, lembra-se do dia emq ue filmaram aquelas imagens: "Vai devagar, Taninha!", "Sim avô.", mas não foi. Foi tão depressa que caiu e magoou um joelho, nada de importante, mas ainda tem a marca, é uma marca velha já. Esta é muito mais recente, ainda nem um ano tem.

"Diz adeus para a câmara!"

Eu respondo-te do lado de cá:
Olá avô, tenho saudades tuas.